19 maio 2010

(Re)Leituras

O longo beijo mergulhou-os numa calma imensa. Fusako não se esquecia da separação do dia seguinte. Mordendo o queixo de Ryuji, tocando as superfícies escaldantes, polidas, onde ele tinha feito a barba, respirando-lhe o cheiro da carne que subia do peito agitado, sentia todos os nervos do corpo dele dizerem-lhe adeus. O abraço forte, furioso, de Ryuji dizia-lhe com quanto desespero ele queria afirmar que ela era real e estava realmente com ele. Para Ryuji este beijo era a morte, a morte por amor com que sempre sonhara. A macieza do lábios dela, a sua boca tão carmesim, ele podia vê-la no escuro, com os olhos fechados, tão infinitamente húmida, um mar tépido de coral, a língua que se agitava como uma alga marinha... neste êxtase negro havia algo directamente ligado à morte. Estava perfeitamente consciente que a deixaria dentro de um dia, mas no entanto estava pronto a morrer por ela, feliz.
(...) Então a chama alumiou-lhe a face e ele viu o fio das lágrims. Fusako apagou o isqueiro ao ver que ele tinha reparado. Ryuji voltou a abraçá-la e, aliviado pela certeza daquelas lágrimas, chorou também.

O marinheiro que perdeu as graças do mar
Yukio Mishima

2 comentários:

Pirolito disse...

Como escreveu Ralph Waldo Emerson: "Podemos viajar por todo o mundo em busca do que é belo, mas se já não o trouxermos connosco, nunca o encontraremos."
De que nos serve tal coisa já será matéria para outro post.
Yukio Mishima (pseudónimo literário para Kimitake Hiraoka)suicidou-se com 45 anos, praticando o ritual japonês "seppuku"...
Puta que pariu... já comento os meus próprios posts...

Ponto de Interrogação disse...

'De que nos serve tal coisa já será matéria para outro post'...

Estou muito, muito curiosa!

Quanto ao comentares os teus próprios posts... Pois... Consideremos uma adenda :-)

 

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