27 outubro 2006

Lindo!...



Ora digam lá se não é bonito.

Que bom que seria se todos conseguíssemos viver sem qualquer constrangimento ou preocupação. Que o simples acto de uma demonstração de afecto, dada ou recebida, estivesse ao alcance de qualquer um de forma tão acessível quanto o ar que respiramos.
Honestamente vos confesso que fiquei emocionado com este vídeo.

Visto pela 1ª vez aqui.

Homenagem

José Rodrigues Miguéis
Escritor
09/12/01 - 27/10/80

Ponho-me a olhar a Avenida cá de cima, da minha água-furtada e meu refúgio, e digo-lhe, seu Apolinário: tudo isto levou uma grande volta. Antigamente vivia-se aqui como num céu aberto. Nem faz idéia. Onde isto vai, parece que não, os dias passam devagar, mas os anos vão-se depressa. A gente só dá por isso quando já não há remédio.
Foi nos começos da República, e eu, de calção, com os sapatos nas poças da chuva, travava os primeiros corpo a corpo com a gramática latina e o verbo Amar. A Avenida era então novinha em folha, como o regime. Começava lá em baixo, num boqueirão sinistro, um rio de lama onde às vezes havia inundações e gritos, entre ribanceiras e prédios esguios, e ia-se perder ao alto, nas quintas e azinhagas. As casas, modestas e limpinhas, tinham fachadas de azulejo de mau gosto, outras eram pintadas a cor. Havia as "terras", lotes vagos de barro viscoso onde a gente ia "reinar", e as carroças se atolavam até aos eixos, com muitas pragas dos carroceiros. As árvores eram frágeis e verdes, de mocidade e esperança. Que sossego o desses dias agitados! Isso não era Avenida, era a Rua do Lá-Vai-Um. O mundo acabava-se ali no redondel da praça: um muro decrépito e, para além dele, era a poesia, o silêncio, o bucolismo e a Perna-de-Pau. As noites uma paz. A brisa trazia lá de cima um cheiro fresco de húmus, de estrumes, de águas e verduras. As meninas pensativas, cheias de Júlio Dinis e pescadinha frita, dedidavam pianos langues, aguitarrados, com as janelas escancaradas, ou então escutavam pelas sacadas, em roupas leves, flutuantes, a voz dos Tenórios empregados em escritórios, gemendo o fado nas ruas: "Ó pálida madrugada, já tenho saudades tuas..."
O luar encharcava a noite, entrava em cascata pelas janelas, vinha ter connosco à cama. As luzes eram raras e mortiças, de gás incandescente. Pairava no ar um resto de Cesário, e muito José Duro e amargo. Noite morta, pelas dez, passava o varino dos jornais, descalço, anelante da maratona em que vinha desde a Baixa, apregoando "A Capital" - e a voz dele tinha tal desgarramento de mundo perdido, que eu, na minha cama fria de impúbere, a seguir-lhe em mente os passos, sentia um aperto na garganta, e uma irresistível vontade de chorar. Pela meia-noite podia-se ouvir um alfinete nas pedrinhas da calçada - às vezes era um morto que tombava, a tiro... Altas horas, trambolhavam rua abaixo as carroças de bois carregadas de hortaliça, a caminho dos mercados. Os carroceiros, de gabão, dormiam sentados nos varais. Passavam tipóias derreadas de boémios e fêmeas que iam madrugar para as hortas. A Júlia Mendes morrera havia pouco...
De dia passavam funerais na lama, ou à torreira do sol, enterrando Chopin juntamente com o falecido-cujo: vinha tudo às janelas ver a carreta da Voz do Operário puxada a braço, aos trancos-barrancos nas covas do futuro pavimento, sacudindo no ar os penachos das flores da Praça da Figueira em cartuchos de papel. "Leva tantas flores!", dizia alguém, com esta nossa secreta admiração pelo luxo na morte; ou, se a carreta era branca: "É um anjinho, aquele vai pró Céu!" A Avenida era uma grande artéria por onde corriam a vida e a morte.


Léah e Outras Histórias, 1959

26 outubro 2006

O mistério da vida

Hoje proponho-vos uma viagem pelo site do fotógrafo Frans Lanting. Prestem especial atenção ao slideshow intitulado "LIFE - A journey through time" (VIDA - Uma viagem através do tempo). Para além da beleza das fotografias, o visitante pode optar por aceder a uma barra cronológica que o situa no tempo, relativamente ao estágio da evolução que determinada foto pretende ilustrar. De igual modo, se quisermos saber mais sobre alguma fotografia em especial, basta que façamos click sobre ela. A apresentação pára momentâneamente para dar lugar a um conjunto detalhado de informações.
Depois digam o que acharam.

Homenagem




José Malhoa
Pintor e escultor
28.04.1854 / 26.10.1933

Homenagem

José Cardoso Pires
Escritor
02.10.25 / 26.10.98

"Há novidade?", bradavam os guardas quando chegavam ao termo do rasto levantado - à herdade iluminada, ao abrigo do pastor ou ao portão defendido pelos cães.
Nem sempre encontravam resposta pronta. Num caso ou noutro abriam-se janelas de mansinho e os cavaleiros varriam, palmo a palmo, com o foco das suas lanternas, os muros, as sombras e os portões.
"Fala a Guarda! O da casa!"
No monte dos Mais recebia-os o feitor, com um grande lobo-de-alsácia pela trela. Oferecia-lhes café e descrevia alcateias de camponeses que assaltavam as redondezas. Os guardas acenavam com a cabeça mas não adiantavam muito. Sabiam que se tratava de ganhões sem trabalho que infelizmente corriam os restolhais, procurando sustento na caça.
"Se não têm política é o menos", diziam.
"Como é o menos? Então a Venatória permite que andem a caçar no defeso? Isso não é crime, senhores guardas? Não é contra o alheio, digam-me?"
Os cavaleiros do sargento Leandro habituaram-se a estas queixas contra os malteses com fome. Ao romper da manhã iriam levantá-los aos montados, suspreendendo-os à cajadada nas moitas.
Achavam-nos em pequenos bandos, ou isolados como vultos solitários, vultos breves, esfiapados na frescura e na primeira claridade do dia.
Láparos, pássaros velhos, tudo o que viesse ao alcance desses ganhões morria. Depois saltavam à estrada e sacudiam os despojos à passagem de turistas e de viajantes:
"Amigo, compre-me esta caça".
Não esmolavam, apresentavam a sua necessidade:
"Amigo, compre-me esta caça".
Os guardas espantavam-nos só com as suas figuras, perfilados no alto dos cavalos. Compreendiam que, na cega perseguição em que se meteram, iam igualmente arrastados no mesmo vento que varre a planície e que leva por diante malteses e caça pobre. Mas, soldados da lei, viam-se diante dos lavradores inquietos, os tais que lhes serviam café e que não dormiam com o pavor das alcateias, e, acenando que sim, continuavam a cavalgada de Setembro, dia e noite através dos campos, até à pausa da ordem naquele largo de Cimadas.

O Hóspede de Job (1963)

25 outubro 2006

Mais um atentado à Cultura portuguesa.

Adeus Museu de Arte Popular!
O Museu de Arte Popular, em Belém, Lisboa, vai fechar e ser substituído pelo Museu Mar da Língua, alusivo aos Descobrimentos (...).
Aplaude-se o encerramento e a escolha da nova temática. Com o importantíssimo núcleo museológico sobre a Expansão portuguesa apresentado pela exposição permanente do Museu de Marinha, que se situa a apenas algumas centenas de metros, a escolha do tema Descobrimentos vem tão a propósito quanto ír vender areia para o deserto ou gelo para o Ártico. A menos que o objectivo seja, paralelamente, o de esvaziar de conteúdos e de razão de existir os organismos culturais tutelados pelas Forças Armadas. Não seria a primeira vez que tal acontece, nem haveria de ser a última. Trata-se de um património da máxima importância que suscita a gula de alguns iluminados. Foi assim no tempo de Santana Lopes - enquanto Secretário de Estado da Cultura - e de Simoneta Luz Afonso. Será que é caso para dizer Eu ainda sou do tempo em que...?
Uma coisa é certa. Este Governo é constituído por tanto génio iluminado que, um destes dias, bem o poderemos acusar de ser o responsável pela crise energética que, inevitavelmente, advirá de tanta iluminação.

23 outubro 2006

Caminhada na "Serra da Lua"

Aquilo que era para ter sido (mais) uma bela oportunidade para disfrutar da miríade de espécies de flora e fauna da Serra de Sintra, das paisagens a perder de vista até às Berlengas e da limpeza de filtros através da inspiração de puro oxigénio foi, afinal de contas, uma marcha forçada de cerca de 16 kms (e porque se atalhou caminho).
Debaixo de uma imensa chuvada por vezes tocada a rajadas de vento a raiar o temporal, a caminhada teve pelo menos a virtude de testar o material até ao limite. Ficámos ontem a saber que a bota esquerda mete água e que o impermeável, ao fim de seis anos de uso intensivo sob água doce e água salgada, entregou, finalmente, a alma ao criador.
O nevoeiro bailava selvagem pelos ares e a visibilidade máxima seria de cerca de 50 metros, (no Convento da Peninha não excederia os 10 metros).
À chegada aos carros no final da caminhada, a única coisa que trazia seca era o céu da boca. Foi despir tudo e ficar de tronco nú, qual Bô Franceneide, transando o corpo numa nice (para quem ainda se lembra de Jô Soares), sob chuva copiosa.
A coisa foi de tal maneira que, enquanto nos preparávamos para zarpar, caiu um galho de Acácia em cima de um Fiat Uno, provocando-lhe uma amolgadela considerável no tejadilho.
Apesar de nos considerarmos caminheiros bem equipados, o capacete não faz parte da nossa palamenta, pelo que achámos que era chegada a hora da partida.
Todos ouviram já falar dos misticismos de Sintra. Para quê desafiar as energias negativas?
Para, pelo menos, terem uma ideia do que se poderia ter visto, deixo-vos um link que, embora comercial (e ninguém me pagou para isso), apresenta uma série de fotos lindíssimas. Vão certamente perceber do que estou a falar.

Juro que não fui eu!

No Iraque nem tudo é sofrimento. Como é que se consegue? Paradoxalmente é à custa do aumento exponencial do sofrimento dos outros.

22 outubro 2006

A secretária do Sócrates

A secretária do Sócrates estava apaixonada por ele mas o nhurro não percebia ou, decididamente, não era de febra mas sim de enchidos que gastava.
Um dia, depois do expediente, ela entrou na sala dele, com um vestido provocante, super decotado, fechou a porta atrás de si e caminhou languidamente até à secretária. Com ares de Mónica Lewinski perguntou-lhe:
- Sr. Primeiro Ministro, vamos fazer uma sacanagem?
- É p'ra já! Onde é que assino?

Conversas em família LII

21 outubro 2006

Travestis políticos

Nunca se viu tão fantástica unanimidade mediática sobre um projecto de Orçamento de Estado. Os economistas continuam a fingir não entender que alimentam um monstro, autofágico, que já começou a engolir a própria cauda. Sabemos que somos vítimas do PEC, da Europa, da globalização, e do fantástico poder do dinheiro. Mas é lastimável que os nossos maiores carrascos sejam sempre os nossos governantes. Sócrates e as suas pequenas marionetas não têm imaginação, nem capacidade técnica, nem doutrinal ou humana para mais. Já mostraram tudo quanto têm para dar.
Incapaz de gerir as receitas do Estado ou de promover o crescimento económico, Sócrates, para recolher aplausos, refugia-se na política do corte. Sem anestesia, nem transfusões. Por isso se não entende tão grande unanimidade opinativa face às graves agressões deste orçamento. Porque este Governo não avança a direito. Faz umas curvas apertadas. Escolhe as suas vítimas e protege, sem vergonha, as suas melhores clientelas. O alarme de Jorge Coelho é sintomático. As almas de Sócrates, Campos, Pinho e outros ditos ‘governantes’ têm direito a inscrição a ouro no livro de honra da mais detestável das direitas. A que suga a vaca até a matar. Desapiedada. Que se não comove com os mais desfavorecidos e está sempre pronta para os atirar ainda mais para baixo na escala social. Quem se não incomoda em diminuir salários reais, quem agrava a carga fiscal dos reformados e deficientes, quem aumenta descontos para a CGA, quem todas as semanas corta nos medicamentos e na assistência médica e aumenta taxas moderadoras, quem ameaça diminuir 27% nos encargos do Estado com a ADSE, quem (no meio desta tempestade) cria excepções para a Banca oferecendo-lhe, como brinde, um regime de favor no apuramento dos seus impostos, não tem sequer direito a andar na rua de cara descoberta. E provoca náuseas quando insiste em dizer-se socialista. Deus livre os socialistas destes atabalhoados travestis políticos.
No limite, todos os socialistas que se empenhem em devolver alguma dignidade à vida política ver-se-ão obrigados a varrer os impostores e a votar na Direita (única alternativa conjuntural) para salvar as tradições e o bom-nome da Esquerda socialista, a sua cultura e os seus valores. Que são uma realidade histórica a respeitar. E que Sócrates aposta em esfrangalhar. Não é uma política restritiva e de rigor que está em causa. É o facto de essa política ser vesga. Maltratar (e beneficiar) sempre os mesmos. Sócrates massacra os portugueses mais desprotegidos com brutais restrições. Que são imediatas. Efectivas. Actuais. Indignas. E empobrecedoras. E nada oferece em troca senão mentirosas miragens. No que diz respeito à sua política social, este Governo espera que os mais velhos morram depressa e fia-se na adaptação e resignação dos mais novos, que não têm a memória de melhores dias. É este o seu programa.

João Marques dos Santos, Advogado
in "Opinião", Correio da Manhã, 20.10.2006

20 outubro 2006

19 outubro 2006

Circula por aí.

Diz o americano: na América, temos um porta-aviões que transporta 1000 aviões!!!!!
Diz o francês: na França, temos um hotel que acomoda 20000 pessoas!!!
Diz o português: eu tenho uma piça onde cabem 200 passarinhos empoleirados!

Passado um bocado:

Diz o Americano: eu exagerei!.. o porta aviões só leva 150 aviões!
Diz o Francês: eu também exagerei, o hotel só dá para 1000 pessoas!!
Diz o Português: eu confesso que também exagerei um bocadinho. O último pássaro já fica com uma patita de fora!!!...

Só para fazer pirraça.

Domingo há caminhada em Sintra. Mais 20 kms nas perninhas do menino.

Ora toma!

Haja alguém (que não apenas eu, que não mando nada) que chame os bois pelos nomes.

Não há direito!

Não há direito que se façam coisas destas ou destas.
É um verdadeiro atentado a dois dos mais depauperados sectores da vida económica nacional.
No entanto, não deixa de ser interessante vê-los olhar um para o outro e exclamar recíprocamente: 'Tadinho do crocodilo!
Já agora, outra coisa ainda mais reprovável é o Estado vir acenar com a baixa do preço de alguns medicamentos como se fosse algo que compensasse as medidas de "aperta-tu-o-cinto-que-a-mim-não-me-apetece", esquecendo-se de referir que, com a descida dos preços, descem igualmente os montantes das comparticipações, pois estes são aplicados percentualmente. No mínimo, a isto chama-se desonestidade intelectual.

14 outubro 2006

Seixal Graffiti

Uma iniciativa que começou com a desconfiança da população, convencida que esta era apenas uma consequência daquela velha máxima Se não os podes vencer, junta-te a eles!", o Seixal Graffiti é hoje uma realidade bem presente na agenda cultural dos jovens do Concelho. Pena é que a sua periodicidade não seja tão regular quanto se desejaria.
O evento decorre durante este fim-de-semana mas os 250 metros de trabalhos vão permanecer durante bastante tempo.
Quando e se puderem dar um passeio pela baía do Seixal, um dos cenários ribeirinhos mais bonitos de Portugal, não hesitem. Já agora, aproveitem para almoçar um belo peixe grelhado.

Auroras boreais

12 outubro 2006

Cavalo-Marinho

Já que estamos numa de fauna marinha:

A matemática é uma coisa tão bonita.

Quem 60 ao teu lado
e 70 por ti,
vai certamente rezar 1/3
para arranjar 1/2
de te levar para 1/4
e depois te dizer: "20 comer!!!"

Bom dia!

Uma estória

Tenho minhas mãos vazias
se só Deus mas pode encher
de flores selvagens, estrelas
e de um bafo de mulher.

Foram tempos de folia
abaixo do meu querer.
Tão disperso, nele havia
imagens de estarrecer.

Eram cavalos alados
de cascos de sal e espuma
e um dedo desenhando
fugas de incerta fortuna.

Era o amor de três laranjas
e uma corda ao pescoço.
O sorriso de Maria
fulgurante nos meus cílios.

Eram, repito, fantasmas
- minha estranha condição
-Mas uma estrela apontava
Rumos ao meu coração.

O que o futuro me tece
não o sei, mas adivinho
a noite que me amanhece
sem que me encontre sozinho.

- Um melro surpreendido
voando montanha acima.
A semente, menos viva,
rompendo floridas brácteas.

Ruy Cinatti, 09.04.83

Homenagem


Ruy Cinatti
Poeta
08.03.1915 / 12.10.1986

11 outubro 2006

The 2006 Underwater Images Contest

Fitas

Hoje é a minha vez!
Vi por acidente. Recomendo vivamente.
As Horas (The Hours).
Trata-se de um drama realizado em 2002 por Stephen Daldry.
Mereceu 8 nomeações para os Óscares, tendo obtido o Óscar para principal actriz, ganho por Nicole Kidman.
Posso dizer-vos, sem margem para hesitações, que foram as melhores interpretações que vi a Nicole Kidman, Julianne Moore, Meryl Streep e Ed Harris. E logo tudo no mesmo filme. Muito, muito bom!

A grafonola do sótão

15 segundos daqui a 15 anos.

E é assim que, por vezes, se fazem grandes descobertas: por acidente!

Homenagens

Álvaro Salema
Crítico literário e ensaísta
??.??.1914 / 11.10.1991



José Marmelo e Silva
Escritor
07.05.1911 / 11.10.1991



Jorge Trincheiras
Bailarino e coreógrafo
??.??.?? / 11.10.1991

08 outubro 2006

Vamos lá ver quem é mais teimoso

O blogger não deixou postar a capa do Separate Lies. Aqui está ela!
 Posted by Picasa

Fitas

Durante a semana que agora termina, vi e revi com renovada satisfação dois magníficos filmes: Mentiras sinceras (Separate lies) e Uma boa mulher (A good woman).
O tê-lo feito deu-me, aliás, a oportunidade de lembrar igualmente o quanto a generalidade dos críticos de cinema me tem sido útil ao longo da vida: Quanto mais eles detestam, mais eu gosto; e vice-versa.
Estes foram dois filmes bastante sovados pela crítica mas que eu não me canso de recomendar.
Tenho para mim que muita crítica de cinema resulta da verborreia pseudo-intelectual de uns quantos "iluminados", que entendem o cinema como algo de transcendente e os filmes como projectos que têm obrigatoriamente de ser produzidos e realizados com o fito único de ganhar Óscares, palmas de ouro em Cannes ou leões de ouro em Veneza. O cinema é, de facto, uma arte e, como tal, uma forma de expressão. Uma forma de expressão que se destina, no limite, não a elevar à enésima potência os ditames plásticos e estéticos mas, tão somente, a divertir, a encantar, a comover, em suma, a instigar sentimentos e estados de espírito no espectador. E é o caso destes dois trabalhos.
Uma boa mulher, realizado por Mike Barker em 2004, é uma comédia romântica que decorre no início dos anos 30, algures na Riviera italiana. Resulta da adaptação ao cinema da peça de Oscar Wilde, O leque de Lady Windermere (Lady Windermere's fan).
O elenco conta com Helen Hunt, Scarlett Johansson e Tom Wilkinson nos principais papéis.
Do lado dos "contras" ficam os desempenhos de Helen Hunt - muito aquém das suas possibilidades e do que a personagem merecia - e de Scarlett Johansson - que ainda alguém um dia me explicará como é que foi parar ao cinema.
Do lado dos "prós" destaco a fotografia, o guarda-roupa e o desempenho irrepreensível de Tom Wilkinson. Este actor, pura e simplesmente, não sabe representar mal.
A merecer ficar na memória estão também algumas pérolas/clichés de diálogo à Oscar Wilde, por vezes um pouco maltratadas por se processarem de forma apressada e atabalhoada.
Mentiras sinceras, realizado por Julian Fellowes em 2005, é um drama sustentado por um triângulo amoroso, com uma história de fazer chorar as pedras da calçada. Trata-se de um argumento que explora de forma crua as complexidades do relacionamento entre duas pessoas, as diferenças entre o amor na sua perspectiva mais carnal e na sua forma mais platónica e genuinamente desinteressada.
Os principais papéis estão a cargo de Tom Wilkinson (sim... o mesmo do filme anterior), Emily Watson e Rupert Everett.
quem tenha gostado e há quem tenha odiado. Eu por mim... recomendo!

Conversas em família L

07 outubro 2006

Azedume



Ando há uns dias para escrever qualquer coisa sobre esta nódoa, mas vai-me tanto fel nas veias que o melhor é abster-me de o fazer.

Uma bela passeata I

Teve ontem lugar mais uma épica jornada empreendida pelo grupo excursionista "Os Pastelões de Belém".
A aventura foi, como não podia deixar de ser, superiormente liderada pelo grande mestre da orientação pedestre J. F.. Este ilustre caminheiro não cessa de surpreender. Vejam lá que ele até sabe quando é que determinado caminho está encerrado só porque a dona do terreno está com os azeites e iça a placa de "propriedade privada". Tem tudo apontadinho numa agenda, até os dias em que o gado bravo anda à solta e que o Ti Gervásio, que é curto de vista, sai de manhã para a caça, largando cartuxadas a tudo o que mexe. Enfim... um espanto!
A caravana era assim constituida por cinco bravos elementos que, em cerca de sete horas, parando em todas as estações e apeadeiros, (com direito a observações de carácter ornitológico e dissecação visual de um pequeno coelho bravo), com 2 escalas para a bucha e assistência médico-medicamentosa, calcorrearam 21 kms entre a Serra do Louro e a Serra de S. Francisco, na região de Palmela, no Parque Natural da Arrábida.
Embora o signatário já tivesse percorrido aquelas paragens em três ou quatro ocasiões anteriores, este percurso é sempre muito bonito de se fazer pela grande multiplicidade de motivos de interesse: As vistas panorâmicas para norte (até Lisboa) e para sul (Tróia e areais brancos que se espreguiçam em meia-lua até Sines) são de fazer perder o fôlego; os moinhos de vento; os sítios arqueológicos; a flora estonteante na sua diversidade onde, sobre os pequenos pontilhados de côr dados por mirtilhos, amoras silvestres, medronhos, arrudas, bocas-de-lobo e lírios, reina implacavelmente o verde esplendoroso dos pinheiros mansos que, como ontem alguém dizia, polvilham as encostas como pompons.
Depois há sempre algo mais a reter destas passeatas: o que diz respeito ao aspecto humano. São as amizades que se estreitam e consolidam, as cumplicidades que se criam e o espírito de solidariedade e entreajuda que se fortalece.
Enfim... embora os meus pés gemam que não, amanhã estava lá outra vez.
Para quem ficar interessado em conhecer mas não tenha quem conheça os trilhos, fiquem a saber que existem passeios organizados. Deixo-vos com quatro sugestões: Uma, duas, três e quatro.

PS: Esta é uma piada particular só para os intervenientes no passeio:
Já alguma vez tinham feito um percurso com direito à descoberta de que uma mesa para merendas deverá ser, afinal de contas, um altar de rituais ligados a questões de fertilidade?
E com igual à vontade pergunto, se alguma vez na vida tinham imaginado vir a assistir à cena absolutamente surreal de ver um troll da mitologia escandinava, sair do interior de uma capela cristã de meados do século XVIII, embrulhado numa toalha turca?
Nunca, jamais em tempo algum!

Uma bela passeata II

Posted by Picasa Foto da região obtida pelo colega caminheiro Mário Nogueira. Daqui.

Uma bela passeata III

Posted by Picasa Foto da região obtida pelo colega caminheiro Mário Nogueira. Daqui.

05 outubro 2006

O século XXI

Todos os anos quase 550 milhões de crianças sofrem violência familiar, trabalham em actividades de risco ou são alvo de mutilações genitais, revela o primeiro estudo global sobre violência infantil da ONU divulgado ontem.
(Notícia aqui)
Oitenta e dois anos depois de assumida em Genebra a Declaração dos Direitos da Criança, quarenta e sete anos depois de apresentada pela UNICEF a Declaração Universal dos Direitos das Crianças e dezassete anos depois de aprovada pelas Nações Unidas a Convenção sobre os Direitos da Criança, estes textos, para desgraça de milhoes de crianças e vergonha de biliões de adultos, valem o valem. Um pouco por todo o mundo, quer por ignorância, imoralidade ou até por força da extrema miséria a que muitos dos países pobres continuam a ser submetidos por parte de outros que muito têm mas nada lhes interessa fazer, as crianças são, como é óbvio, o elo mais fraco.
Se há coisa que me põe lágrimas nos olhos é ver crianças feitas bandidos, soldados, escravos, mendigos, prostitutas... mostrarem-nos o rosto feio da nossa própria perdição.
Quantas décadas mais? Quantas tragédias mais? Quanto tempo mais continuaremos a deixar que aqueles em quem delegámos poderes continuem a assobiar e a olhar para o lado?

Assim como as flores

Ei, eu sou criança!
Não sou malabarista,
Nem equilibrista,
Muito menos sou palhaço,
De toda essa situação.
Eu sou criança!
Gosto de brincar,
De pular, me divertir,
Gosto de sorrir.
Comer, pelo menos uma vez no dia,
Sem catar lixo por aí.
Mas o que é isso?
Tantos maltratos,
Abandono e exploração,
Tu não vês que sou criança,
Preciso de proteção!
O que vai ser da minha vida?
O que vou ser quando crescer?
Ora, ora minha gente!
Vai depender do que eu aprender.
Me ajuda!!!
Mas, não me dê esmola,
Meu lugar é na escola,
Ter família,
Um lugar para morar,
Sem precisar trabalhar.
E se não for pedir muito, sonhar...
Eu ainda sou criança.
Preciso ser cuidada,
Preciso de ti.

Poema de Isa Maria Andrade Martins

5 de Outubro

De tal forma diz Pátria, essa bandeira bela,
Que ou esta Pátria vive erguendo-a bem nos braços,
Ou esta Pátria morre amortalhada nela!
Bernardo Passos (Poeta)

Conversas em família XLIX

Homenagem



Lima de Freitas

Pintor, ensaísta, desenhador e gravador

??.??.1927 / 05.10.1988

Rosa Damasceno

Actriz

23.02.1849 / 05.10.1904

04 outubro 2006

Homenagem


Cândido dos Reis
Oficial da Armada
16.01.1852 / 04.10.1910





Alfredo Keil
Pintor e compositor
03.07.1850 / 04.10.1907

03 outubro 2006

Alfredo, é Gisele!

Sora vê, daqui do táxi a gente sabe é cada coisa... Sabe e aprende, aprende até a não ter preconceito. Outro dia peguei um casal assim já de meia idade, bem apessoado, lá no centro, no Teatro Municipal. Eles tinham ido vê uma tal de uma Ópera, sei lá. Já eram umas 11 e meia da noite, a gente veio bem até o Aterro, entramos em Botafogo e o trânsito emperrou. A mulher já azedou na hora e foi falando para o marido :

- Que trânsito é esse, quase meia noite? Não é esquisito, Alfredo?

E o tal do Alfredo parecia um homem rico mas não era fino, sabe ? E não gostava mais dela, eu acho. O cara era uma múmia. A resposta dele pras conversas da mulher tavam mais pra rosnado, sabe?

- Alfredo, isso não é uma absurdo? Nós aqui parados num trânsito quase de madrugada, não entendo, é estranho, hoje é sábado. Será que é algum acidente, Alfredo?

Como o homem não dizia nada, aí e eu interrompi: com todo respeito sabe o que é isso madama? Simplesmente aqui virou um lugar só de "homensexuais" e mulher sapatona. É cheio de barzinho deles, a rua toda. Fim de semana ferve. Quem quiser ver homem beijando homem e mulher se esfregando em mulher, é aqui mesmo.


- Você tá ouvindo, Alfredo? Meu Deus, eles agora tem até bar pra eles, até rua!? Não é um absurdo, Alfredo?

- Ô Onça, cê me conhece, sabe bem como é que eu sou. Pra mim isso se resolve é na porrada. Se eu sou o pai, desço do carro e não quero nem saber o que é que entortou, o que é que virou, não quero saber o que é cú e o que é fechadura, baixo o sarrafo na cambada! Eu, com sem vergonhisse, o sangue sobe, eu viro bicho.

- Pára de falar essas palavras de baixo calão, Alfredo. Hum! Fica de gracinha que a pressão vai lá nos Alpes, você sabe muito bem o que é que o médico falou ..., não é motorista? Alfredo não é muito esquentado?

Eu dei o meu pitaco:
- É madame, o negócio que ele tá falando é como eu vi no filme. Uma metáfora. Ele não vai bater, vai só ficar zangado.


- E o senhor sabe o que é metáfora? O senhor entende de metáforas? Escuta isso Alfredo! O que é metafora, seu motorista?

- Metáfora pelo que eu entendi é assim: aquilo não é aquilo, mas é como se fosse aquilo. Então, em vez da gente dizer que aquilo é como se fosse aquilo, a gente diz que aquilo é aquilo. Mas não é. É como se fosse. Foi?

- Eu acho que o senhor tá certo, mas na verdade eu estou é chocada com essa libertinagem. Olha aquele homem... que safadeza me Deus! E de bigode ainda! Escuta isso Alfredo!

- Escutar o quê, Coisa?

- O que eu estou vendo, gente! Ai, Alfredo, não está vendo? Parece que é cego, não é motorista?

- Hoje tá até fraco. Eu falei. Hoje nem tem os “general”?

- Quem são? Escuta isso Alfredo?

- General das sapatona é aquelas de coturno que parece mais com um macho do que qualquer coisa. E o outro general é o homem transformista que é a traveca, mas anda é na gillete mesmo.

- Tá ouvindo, Alfredo? A violência e a decadência como estão?

- E a gente vai ter que ficar parado nesta merda, ô Coisa?

- Calma Alfredo, não fica nervoso! Isso é questão do nível das pessoas. A gente que tem... não é motorista? ... mais condições, temos que entender essa...,essa..., como é que eu digo, meu Deus? Essa...

- Putaria!
(Falamos juntos, eu e o tal do seu Alfredo com cara de doutor de num sei de quê.)

- Cruzes Alfredo, não era isso que eu ia.... Alfredo, olha aquela moça! Gente, uma menina, dezoito no máximo, e a outra maiorzuda no meio das pernas da coitadinha, fazendo sabe lá o quê !!! Tá vendo Alfredo aquela alí? Alí, aquela Alfredo, em cima do carro! Olha lá Alfredo, a mão da grandona na menina! Elas vão ser beijar na boca, minha Nossa Senhora...


- Que transitozinho, hein? nunca mais viremos por Botafogo, tá decidido!

- Mas Alfredo olha a menina! Tá beijando, tá beijando, tá beijando Alfredo! Ela parece... Alfredo é Gisele! Alfredo! Nossa filha!?

- Filha da puuuutaaa!...

E desmaiou o tal doutor, enquanto a jararaca da mulé ventou porta afora de sapato na mão atrás das duas e eu pensando: não quero nem saber, encosto aqui mesmo e espero o resolver, que uma corrida dessa eu não vou perder, que eu não sou bobo e nem sou rico. É ruim de eu ir embora, heim?
Então eu fiquei naquela situação: eu com um cara que era um ex-valente todo desmaiado no banco de trás parecendo uma moça, a mulé saiu pisando forte que nem um general, quer dizer, tudo trocado e eles reclamando da filha. Se eu pudesse eu ia lá defender a moça, mas não posso, já que o negócio é de família, né?
Eu não tenho preconceito, mas é isso que eu tava falando pra senhora: daqui a gente sabe cada coisa! E é cada um com o seu cada qual.

"­Alfredo, é Gisele", de Elisa Lucinda in Contos de Vista
PS: Especialmente dedicado ao Sanfona.

Haja alguém que me explique


Haja alguém que me explique como é que casamento é coisa para levar a sério?

My kind of woman


A pedido de muitas famílias, eis "Fever" - Rita Moreno e Animal.

Homenagem

Miguel Bombarda
Médico Psiquiatra
??.??.1851 / 03.10.1910
 

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