Um pequeno rectângulo de dezoito por treze centímetros. Duas calhas cromadas aplicadas nas extremidades superior e inferior comprimiam a base e o vidro. Aconchegada entre ambos morava uma fotografia. Não uma fotografia qualquer. O teu retrato.
Contemplei-te, a medo. Há muito que o não fazia. Mais exactamente desde que foras, num arrufo de dor, exilada para trás da generosa lombada do Triunfo do Barroco.
Estranhamente, o teu sorriso revelou-se menos conversador. A sensação que sempre retirei daquela foto era a de que bem se podia tratar de uma menina irreverente, trocista, de dentes brancos como a espuma do mar e cabelos revoltos como o seu próprio espírito. E conversavas comigo...
Mas não hoje, não desta feita.
A densidade das sensações deu lugar à frieza da uma impressão a preto e branco reduzida à pobreza da sua bidimensionalidade.
Levantei-me da cadeira, indeciso. Abri uma cerveja e passei o vidro gelado pelas frontes. Sorri. Pudesse eu arrancar do peito o meu coração e aí sim, teriamos gelo polar.
Voltei a sentar-me.
Com uma solenidade que eu próprio não compreendi, retirei uma calha, depois a outra. Separei a base do vidro e o teu retrato precipitou-se no vazio, em espiral, como uma folha tocada a vento.
Caíste-me no chão mas não no esquecimento.
Tudo no ciclo da vida tem o seu tempo e esse dia chegará, se assim tiver que ser.
09 junho 2010
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4 comentários:
Há pessoas que nunca esquecemos, apenas nos habituamos a viver com a sua ausência...
Bjo
Madrugadeira, hein?
Nops...é mais notivaga mesmo...
Não chore porque acabou. Sorria porque aconteceu...
Bjs
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